Publicidade.
Publicidade

vELA DE ESTAI

Francisco Maduro-Dias

AÇORES, UM LUGAR?

Se há frases que conduzem a ideias e ideias que conduzem a um enorme cabaz de erros, esta é, seguramente, uma delas.
O tema não é novo, nestas páginas, mas acredito que, desta forma, consigo tornar mais claro o que pretendo explicar.
Por outro lado, estando os habitantes dos Açores em vias de ter de eleger, novamente, alguns representantes para a Assembleia da República, levar este tipo de coisas na mala, para incomodar os colegas com coisas diferentes, talvez valha a pena.
É que, de facto, os Açores não são um lugar! Nem cultural, nem geográfica, nem politicamente.
Quando dizemos ou escrevemos "os Açores", estas ilhas como que encolhem e ficam do tamanho do Porto, ou, mesmo de Paris ou Londres.
Não se trata de uma simples questão de orgulho identitário, é que, vendo as coisas desse modo, as pessoas imaginam que um fim de semana basta, que três ou cinco dias são suficientes para uma visita, que um hospital resolve as questões de saúde, que um carro de bombeiros vai num instantinho ali ao Corvo ou ao Nordeste, se a cozinha do café pegar fogo.
E nós, os que aqui moramos, os que levam a sérios as tarefas do planeamento, sabemos que não é assim.
Politicamente, também, a ideia de os Açores serem um lugar, e de quererem ser apenas um lugar, digamos, "fora da mesa", destrói grande parte do capital internacional do país, nacionalmente da região e, entre nós, nestas ilhas, da ideia que temos do lugar onde moramos e da realidade geográfica que isso comporta.
Uma das maiores, senão a maior, das dificuldades que um ilhéu tem, e não precisa ser português, é isso de ver o mundo como sendo feito de mar e terra, por esta ordem. Com o grande mar a envolver e a ligar as terras, os lugares e as suas portas, os portos.
Para um continental, qualquer um e não precisa ser português, o mar fica "ali ao lado", fora do espaço de vivência natural a menos que seja pescador ou mareante. Algo que serve para ir de verão molhar os pés, mas não é preciso para a vida, nem faz parte dela.
A comunicação social tem, aqui, um papel enorme. Quando um jornalista ou meteorologista diz "o tempo, em todo o país", referindo-se ao território continental apenas, empurra, logo, para fora da borda das ideias e da imaginação, os Açores, a Madeira e as Selvagens. Não contribui para meter na cabeça de todos e de cada um a real dimensão geográfica do país que temos e somos.
Pior, muito pior ainda, é que isso nos impede de perceber as responsabilidades que temos e o modo como os outros nos vêem, porque esses, sim, vêem doutra forma.
Há uns anos aplaudi a compra dos submarinos e acrescentei que esperava não dois mas quatro, pelo menos. Recordo os comentários, negativos na maioria, questionando porque razão Portugal precisava de submarinos.
O mesmo se podia perguntar sobre a força aérea ou até que ponto temos consciência das responsabilidades internacionais de controle aéreo, ou de busca e salvamento, que tornam Portugal um pais com fronteiras com vários países e não apenas a Espanha.
Igualmente achei interessante, e lamentável, que quase ninguém perceba a relevância que tem a rede de cabos submarinos, não apenas para Lisboa, a eterna e inefável Lisboa-capital, mas para unir o país que somos ou, melhor dizendo, que, sendo em geografia, não somos em entendimento.
Pesquisei alguns números que deixo aqui.
De Lisboa às Lajes, na ilha Terceira, são 1560 km e ao Corvo são 1925 km. De Lisboa a Madrid são apenas 625 km... precisamos de ir um bocado para lá de Barcelona (1247 km) para encontrar parecido.
Do Corvo ao Funchal são 1500 km e daí ao cabo de Sagres são 873 km.
Já sei que é mar, mas não são apenas peixes, e já sei que não existem comboios nem pontes, nem auto-estradas, mas é uma encruzilhada tremenda, complexa, importante, e faz toda a diferença.
É que o nosso elemento diferenciador, no contexto colectivo, nomeadamente europeu, está aqui, no imenso mar que rodeamos e nos rodeia, por onde passam navios e cabos, aviões, gente, mercadorias e ideias.
Importa perceber que isto tudo influencia, negativamente, o turismo que temos, a economia que temos, a população que temos, os futuros que podemos ter.
Importa mudar. E temos de ser nós a começar.

Opinião
Nº Assin./ID:
Chave:
Recordar:
Assinar
Forum DI
Forum Desporto
< Abril 2025
DSTQQSS
1 2 3 4 5
6 7 8 9 10 11 12
13 14 15 16 17 18 19
20 21 22 23 24 25 26
27 28 29 30
Diário Insular.pt Webmaster: Rui Azevedo r-site.net